27 de fevereiro de 2005


Um nada, um intervalo vazio, preenchido com cores e textos.
Vem aí:
O HIATO
Obra de Paulo César Almeida e Sabrina Moura

17 de fevereiro de 2005

A Maldição do Artista

1- Não há o que se dizer a respeito dos nosso estimados artistas, tanto em nossa cidade como em variados logradouros desse país. Eles são responsáveis por incomodar as beatas conservadoras que insistem em viver dentro daquilo que os parâmetros que a própria sociedade determinou e acredita ser o “correto”. Eu vos digo, não existe conceito mais relativo que o de certo e errado. Não existe uma unidade, uma unanimidade.

2- Agradeço ao sistema essa dádiva, pois vislumbrem, meus amigos leitores, se existisse uma só forma de se viver “o correto”. Certamente viveríamos sobre uma lei do absurdo, onde nossa família, namorados e patrões seriam ciborgs típicos das fitas de Spielberg.

3- No entanto, não era exatamente sobre isso que gostaria de falar. Certa vez, o Humberto Gontijo, um grande ator, um dos maiores talentos da nova geração confidenciou a mim um fato doloroso. Peço licença a ele para quebrar esse segredo de confessionário. Somos amigos e por isso tomei tal liberdade.

4- O nobre ator me disse: “Não existe para o artista uma felicidade amorosa”. Essa declaração me fez pensar em profundidade sobre o coração de um artista. Naquele momento pensei ser uma hipérbole a afirmação do meu nobre colega. Mas pude ver que a razão iluminava sua reflexão.

5- É realmente recompensador ser uma artista. Muito embora sejamos discriminados e incompreendidos, não há nada mais regozijante que ver seu filho, sua obra sendo disseminada, aclamada, aplaudida. No entanto, há que se ressaltar com ênfase que um deflúvio fica para se pagar.

6- O que pretendo dizer é que alguém que possivelmente queira se enveredar pelos caminhos da arte necessita, previamente, fazer uma escolha. O artista é um fadado a ser um desinfeliz no amor. Isto é fato, mas que cabem várias objeções.

7- Independentemente das vozes que hão de objetar esse fato, eu repito: O artista tem em sua essência a nostalgia do amor mal acabado, a amargura do desafeto. Isto ocorre com o artista de fato, não esses pseudo-famosos que se auto-proclamam “celebridades”. Quanto à nomenclatura eu vos digo: as celebridades de celebres não possuem nem um fio de nylon.

8- Dessa forma, o artista se torna artista verdadeiramente. Aquele que possui a mancha do rancor, a marca do desprezo em sua pele e sua mente. Não há nada mais enriquecedor para um artista que uma tragédia, sobretudo uma tragédia afetiva. A titulo de um exemplo rasteiro cito a bela Ana Paula Arósio que, no início era uma bárbie, mas que depois de seu noivo ter se suicidado bem sob seus olhos, se tornou uma grande atriz, com traços dramáticos e olheiras de uma Fernanda Montenegro.

9- Sim, a arte é uma dádiva. Mas existe também a maldição de ser um artista. A infelicidade do artista também pode ser considerada uma dádiva, pois ela lhe proporciona uma emoção profunda e humana, o que nos aproxima cada vez mais dos nossos interlocutores causando a imediata identificação.

10- Não pretendo aqui desanimar quem quer que seja a prosseguir acreditando em sua arte. Uma vez que, quem tem a arte pulsando nas veias jamais se desiludirá com esses aspectos. Ser artista não se escolhe, mas sim se é escolhido para fazer arte. E aquele que se sente feliz, mesmo com as mazelas sentimentais é por que finalmente se tornou um verdadeiro artista.

11- Repeti demasiadamente neste texto a palavra “artista”, o que, para os puristas gramaticais seria um pecado. Mas uso e sempre usarei essa palavra iluminada por ribaltas e olhares. Quem possui amor à arte não se reprime perante os “nãos” que recebe. O grande antídoto para a desilusão é criar, criar e amar profundamente aquilo que cria.

9 de fevereiro de 2005

COMO VENDER UMA CUECA AMARELA PARA UM HOMEM CASADO QUE MORA NO CENTRO DA CIDADE, DONO DE UM TELEFONE BEGE.

Homem é homem e fim de papo. Mas aquele era alguém. Seu casamento era como todos os demais: chato por natureza, rotineiro por excelência. Não havia o que lhe proporcionava maior felicidade, a não ser seu amigo intimo fiel, que não era seu cachorro nem algo parecido. Para os olhos externos, aquele homem tinha uma vida perfeita, a mulher perfeita, os filhos perfeitos, um emprego perfeito, morava numa casa e num lugar perfeito, ele próprio era o Senhor Perfeição e ainda possuía um telefone bege. Existiria alguém mais feliz?
Até que um dia seu irmão lhe questionou: “Você conhece a cueca amarela?” O Senhor Perfeição não deu muita pelota para o que seu irmão caçula lhe indagava. Mas a pergunta se fez voz novamente, pelo mesmo irmão, e numa desafiadora afirmação: “Você não é feliz sem conhecer a cueca amarela.” Uma ponta de dúvida surgiu na cabeça daquele homem. Seria ele realmente feliz? Não era possível que um produto tão ínfimo e dispensável fosse tão cheio de possibilidades e de felicidades. O que era uma ponta de duvida se transformou em tormento e, num belo dia, ele argüiu ao seu irmão: “Mas o que faz essa cueca amarela?”. Cheio de malícia, o rapaz explicara que a cueca amarela energizaria os chacras e lhe daria mais potência para dar conta da noite-a-noite da sua alcova. Impressionado com o discurso pseudocientifico de seu irmão, aquele homem perfeito declarou: “Eu quero uma cueca amarela”. Sem pestanejar, seu irmão foi-lhe buscar o sonhado produto. Chegou ela, surrada, suja, com alguns furos, mas amarela como uma manga. O preço do produto foi sugerido pelo irmão e não questionado pelo homem perfeito. Adquiriu com a felicidade daqueles que compram uma cueca amarela.
Hoje o Senhor Perfeição é um Senhor Perfeição dotado de uma cueca amarela. Sua vida permanece a mesma, exceto para ele próprio, pois a compra da cueca amarela lhe proporcionou um sentimento de renovação espiritual. Até seu amigo intimo fiel se tornou mais atuante e confiante. Enquanto o irmão conseguiu levantar a grana que precisava para comprar sua moto, uma moto amarela que o fez mais evidente aos olhos femininos. Homem é sempre homem.

4 de fevereiro de 2005

Viver a vida. Mas como?

O lugar-comum preferido das canções ideologicas reside num valoroso conselho armado e desfarçado em versos rimados que, logo, logo ficam martelando nossas cabeças. O tal conselho se refere diretamente ao ato de viver a vida intensamente, fazermos de cada ato "o único", aproveitar o hoje e viver, viver pra valer. (perdoe-me, leitor, não pude resistir à rima)
O que ocorre, na verdade, é que somos escravos do nosso próprio tempo. Temos compromissos demais, "depois" demais, "amanhãs" demais. O hoje se torna um momento de transição e não o nosso verdadeiro presente. Não imaginamos que o "amanhã" não existe. Ele é completamente subjetivo, abstrato. E o "ontem" é uma pagina empoeirada da história.
Me vem, então, a grande idéia, a descoberta da polvora cantada em verso e prosa pelas melodias. Vivamos a vida intensamente, cada momento. No entanto, este inquieto cronista vos argui: Como????. (com todas essas interrogações). Qual o grande segredo de viver a vida? Seria o Carpe Dien mais uma utopia da humanidade?
Chega. Não quero ficar enxovalhando o leitor com tantas perguntas. Mesmo porque você tem coisa melhor para fazer. Tal como: Viver a vida intensamente.
Amarro-me numa conclusão rasteira. Viver a vida é deixar o destino te levar e o amor acontecer. O que vem depois é "amanhã".