17 de fevereiro de 2005

A Maldição do Artista

1- Não há o que se dizer a respeito dos nosso estimados artistas, tanto em nossa cidade como em variados logradouros desse país. Eles são responsáveis por incomodar as beatas conservadoras que insistem em viver dentro daquilo que os parâmetros que a própria sociedade determinou e acredita ser o “correto”. Eu vos digo, não existe conceito mais relativo que o de certo e errado. Não existe uma unidade, uma unanimidade.

2- Agradeço ao sistema essa dádiva, pois vislumbrem, meus amigos leitores, se existisse uma só forma de se viver “o correto”. Certamente viveríamos sobre uma lei do absurdo, onde nossa família, namorados e patrões seriam ciborgs típicos das fitas de Spielberg.

3- No entanto, não era exatamente sobre isso que gostaria de falar. Certa vez, o Humberto Gontijo, um grande ator, um dos maiores talentos da nova geração confidenciou a mim um fato doloroso. Peço licença a ele para quebrar esse segredo de confessionário. Somos amigos e por isso tomei tal liberdade.

4- O nobre ator me disse: “Não existe para o artista uma felicidade amorosa”. Essa declaração me fez pensar em profundidade sobre o coração de um artista. Naquele momento pensei ser uma hipérbole a afirmação do meu nobre colega. Mas pude ver que a razão iluminava sua reflexão.

5- É realmente recompensador ser uma artista. Muito embora sejamos discriminados e incompreendidos, não há nada mais regozijante que ver seu filho, sua obra sendo disseminada, aclamada, aplaudida. No entanto, há que se ressaltar com ênfase que um deflúvio fica para se pagar.

6- O que pretendo dizer é que alguém que possivelmente queira se enveredar pelos caminhos da arte necessita, previamente, fazer uma escolha. O artista é um fadado a ser um desinfeliz no amor. Isto é fato, mas que cabem várias objeções.

7- Independentemente das vozes que hão de objetar esse fato, eu repito: O artista tem em sua essência a nostalgia do amor mal acabado, a amargura do desafeto. Isto ocorre com o artista de fato, não esses pseudo-famosos que se auto-proclamam “celebridades”. Quanto à nomenclatura eu vos digo: as celebridades de celebres não possuem nem um fio de nylon.

8- Dessa forma, o artista se torna artista verdadeiramente. Aquele que possui a mancha do rancor, a marca do desprezo em sua pele e sua mente. Não há nada mais enriquecedor para um artista que uma tragédia, sobretudo uma tragédia afetiva. A titulo de um exemplo rasteiro cito a bela Ana Paula Arósio que, no início era uma bárbie, mas que depois de seu noivo ter se suicidado bem sob seus olhos, se tornou uma grande atriz, com traços dramáticos e olheiras de uma Fernanda Montenegro.

9- Sim, a arte é uma dádiva. Mas existe também a maldição de ser um artista. A infelicidade do artista também pode ser considerada uma dádiva, pois ela lhe proporciona uma emoção profunda e humana, o que nos aproxima cada vez mais dos nossos interlocutores causando a imediata identificação.

10- Não pretendo aqui desanimar quem quer que seja a prosseguir acreditando em sua arte. Uma vez que, quem tem a arte pulsando nas veias jamais se desiludirá com esses aspectos. Ser artista não se escolhe, mas sim se é escolhido para fazer arte. E aquele que se sente feliz, mesmo com as mazelas sentimentais é por que finalmente se tornou um verdadeiro artista.

11- Repeti demasiadamente neste texto a palavra “artista”, o que, para os puristas gramaticais seria um pecado. Mas uso e sempre usarei essa palavra iluminada por ribaltas e olhares. Quem possui amor à arte não se reprime perante os “nãos” que recebe. O grande antídoto para a desilusão é criar, criar e amar profundamente aquilo que cria.

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